O COMPUTADOR NAS ESCOLAS
Patrícia Vasconcellos Pires Ferreira
O que precisamos refletir é como utilizá-lo na escola, pois hoje o que temos são os laboratórios de informática, onde os computadores ficam centralizados, e a informática como uma disciplina da grade curricular, com 45 minutos de aula e provas para nota.
Introdução
O uso do computador nas escolas já não é mais novidade para a maioria dos alunos das escolas particulares e, até, públicas, sendo, inclusive, motivo de propaganda em outdor.
É muito freqüente a pergunta “Vocês ensinam informática?” feita por pais, ansiosos por preparem seus filhos para um futuro de sucesso, na hora da matrícula em uma nova escola.
Porém, é importante salientarmos, que as técnicas de “informática” ensinadas hoje nas escolas, provavelmente, estarão superadas quando essas crianças chegarem ao “futuro” tão preparado pelos pais zelosos por seus êxitos profissionais. Não sabemos ainda como serão os computadores do futuro! Não sabemos ainda que linguagem utilizaremos na comunicação homem/computador! Então, precisamos estar cientes de que ao treinarmos os nossos futuros profissionais em programas de computador que não existirão mais, da forma como hoje se apresentam, não os estamos treinando para o mercado de trabalho; estamos, no máximo, desmistificando o uso dos computadores, familiarizando nossas crianças com essa nova tecnologia.
Mas, então, não devemos utilizar o computador nas escolas?!! Se ele já faz parte da realidade social da maioria das crianças não deveria ser também inserido na realidade escolar dessas crianças?!!
Claro que sim! Afinal, o computador é uma máquina com características que nenhuma outra tecnologia educacional até hoje apresentou:
diversas finalidades de uso (folha de pagamento, produção de um livro, edição de um vídeo-clip);
recursos de multimídia (som, imagem, texto);
resposta imediata – feedback (redirecionamento do que está sendo realizado);
virtualidade das informações processadas.
O que precisamos refletir é como utilizá-lo na escola, pois hoje o que temos são os laboratórios de informática, onde os computadores ficam centralizados, e a informática como uma disciplina da grade curricular, com 45 minutos de aula e provas para nota. Esse é um processo válido dentro da chamada “alfabetização em informática”, mas não podemos chamar essa forma de utilização de “informática educacional”. Infelizmente, esse ainda é o quadro encontrado na maioria das escolas que utilizam o computador com seus alunos. Com essa forma de uso do computador, estará a escola utilizando o computador como uma ferramenta pedagógica de auxílio ao professor e aos alunos no processo de ensino-aprendizagem?
O Computador como Ferramenta Pedagógica
O uso do computador, enquanto instrumento tecnológico, na educação está sempre associado a milagres ou a revoluções. O computador, por si só, não é um agente de mudanças. Se para o professor, ensinar é transmitir conhecimento, é fixar regras, o computador, com todos os seus recursos de multimídia (som, imagem, animação), será apenas uma versão moderna da máquina de ensinar skineriana. Nele, software, ditos educativos, transmitirão informações de forma muito atrativa, farão exercícios de fixação de conteúdos com um controle preciso sobre a quantidade de erros de cada aluno (sem se preocupar com a qualidade do erro) e proporcionarão a todos a falsa idéia de modernização. O que acontece de fato, na grande maioria das vezes, é uma modernização conservadora, onde o “espírito” revolucionário do uso do computador é subvertido pelo sistema educacional vigente e convertido em instrumento de sua consolidação.
O computador pode ser uma ferramenta muito útil ao professor na transmissão de informações aos seus alunos, pois com todos os seus recursos, enriquece esse processo. O computador dentro das salas de aula, junto com o quadro, o giz, o vídeo, a tv, o som, os mapas, os livros, os gibis, as revistas, os jogos pedagógicos, a cola, a tesoura, o lápis de cor. O computador dentro da sala de aula junto com o professor e com os alunos, dentro da proposta pedagógica da escola.
Para fazer o quê? O seu uso vai depender da visão do professor sobre o que é ensinar e o que é aprender, da visão do professor de como se constrói conhecimento.
Numa visão mais abrangente de construção de aprendizagem pelo aluno, sendo o professor um mediador desse processo, o computador poderia ser utilizado:
como fonte de pesquisa de informações na Internet ou em software específicos (enciclopédias eletrônicas);
como meio de comunicação e discussão de informações(mails e fóruns);
como ferramenta para registrar informações (editores de texto, editores de imagem e som);
como organizador de informações (bancos de dados ou software de apresentação);
como ferramenta de apoio para o trabalho com alguma informação específica a ser vista pela turma (questões ortográficas, simulações de experiências químicas);
como ferramenta que permite o registro de informações pela expansão de algumas habilidades, às vezes não muito desenvolvidas em algumas crianças (crianças que não apresentam uma boa coordenação motora por conta de uma paralisia cerebral e que podem utilizar o teclado do computador para produzir um texto ou um desenho);
como ...
Relação de Aprendizagem: Professor/Aluno
Reflitamos um pouco: a matéria-prima do computador é a informação. Então, ele armazena, recupera, trata e exibe informações.
Mas, informação não é a mesma coisa que conhecimento, pois o conhecimento é a re-significação da informação a partir do saber de cada um. O saber é a linguagem dos símbolos, é a linguagem da originalidade, onde cada um se inscreve diferente do outro numa mesma cultura, sendo intransferível. O conhecimento é a linguagem dos conceitos. A criança precisa passar da originalidade da experiência (saber) para a generalidade do conhecimento e esse processo ocorre graças à interferência do outro, pois a informação que vem do outro para interferir no saber é necessária para a construção do conhecimento. Aprender é fazer próprio o que é do outro, é apropriar-se.
Por isso, é impossível a substituição da pessoa-professor pela máquina-instrutor, ainda que os computadores se sofistiquem a nível de hardware e os software se tornem cada vez mais atrativos, pois a aprendizagem envolverá sempre a subjetividade de dois sujeitos em relação. Ensinar não é apenas transmitir conteúdos e aprender não é apenas memorizá-los.
Foi o conceito psicanalítico de transferência, que pôde ser estendido à relação professor-aluno, a grande contribuição da Psicanálise à Educação, pois a partir dele, observou-se que na escola, como na vida, também se aprende por “amor a alguém”. A partir da análise da relação professor-aluno se pode pensar no que faz um aluno aprender, no que o faz acreditar no professor.
O ser humano não aprende sozinho. O processo de aprendizagem sempre supõe a relação de uma pessoa (o aprendiz) com outra que ensina (o professor); aprender é aprender com alguém, que será colocado numa determinada posição de suposto saber. Freud (citado em Kupfer, 1992) nos mostrava:
“No decorrer do período de latência, são os professores e geralmente as pessoas que têm a tarefa de educar que tomarão para a criança o lugar dos pais, do pai em particular, e que herdarão os sentimentos que a criança dirigia a esse último na ocasião do Complexo de Édipo. Os educadores, investidos da relação afetiva primitivamente dirigida ao pai, se beneficiarão da influência que esse último exercia sobre a criança.”
A ênfase freudiana não está concentrada nos conteúdos cognitivos a serem transmitidos do professor para o aluno, mas no campo que se estabelece entre professor/aluno, uma relação que primeiramente foi dirigida ao pai. Transferência é nome dado pela Psicanálise a este campo. Só assim o professor pode tornar-se a figura a quem serão endereçados os interesses dos alunos. A transferência se produz quando o desejo de saber do aluno se liga à pessoa do professor, que passa a ser depositário de algo que pertence ao aluno, esvaziando-se enquanto pessoa.
Kupfer (1992) ressalta que “o encontro entre o que foi ensinado e a subjetividade de cada um é o que torna possível o pensamento renovador, a criação, a geração de novos conhecimentos. Esse mundo desejante, que habita cada um de nós, estará sendo preservado cada vez que um professor renunciar ao controle, aos efeitos de seu poder sobre seus alunos”.
Compreender, portanto, é uma operação que toca no mais essencial da constituição do ser. Por isso, máquina alguma poderá pensar como um ser humano, pois jamais o conhecimento “produzido” por ela será capaz desta dimensão inconsciente que envolve a inteligência e o processo de aprender.
O Psicólogo na Escola: Aprendizagem
Na escola, os profissionais que trabalham no processo de ensino-aprendizagem das crianças não são apenas os seus professores. Existem também os Psicólogos que cada vez mais trabalham numa abordagem de prevenção de problemas de aprendizagem, promovendo reflexões, elaborando projetos junto aos professores. Poderia esse profissional utilizar o computador como ferramenta que facilitasse a construção do conhecimento pelo aluno? Pensamos que sim, visto que o uso do computador traz consigo alguns pontos muito importantes para a leitura psicológica do processo ensino-aprendizagem:
há circulação da informação, o que permite sua apropriação pelo aluno;
o erro é encarado como algo natural e a virtualidade das informações permite que todo processo possa ser feito/refeito;
os recursos de multimídia (som, imagem, texto) possibilitam uma transmissão de informações de forma mais rica;
existe a possibilidade do próprio aluno conduzir o seu processo de investigação de informações no computador;
através do uso de software, o aluno pode produzir material que apresente uma beleza estética que ele ainda não conseguiria sem os recursos da informática.
Não são poucos os mitos/medos que permeiam o imaginário dos educadores quando se fala em computador:
O computador isola as crianças; como não queremos crianças que não se relacionem, devemos afastá-lo da sala de aula.
O computador vai tirar o poder do professor como único detentor das informações; a classe vai virar uma bagunça, com todos querendo falar ao mesmo tempo, buscando informações e trazendo respostas que talvez não sejam adequadas para o grupo.
O computador vai fazer o professor dizer ‘não sei’; os alunos sabem mais de computador do que o próprio professor.
O computador vai substituir o professor; os recursos de multimídia do computador são muito mais atraentes do que o quadro e o giz que o professor utiliza na transmissão de informações.
O Psicólogo Escolar pode promover uma discussão com os professores para que esses medos sejam trabalhados a partir da visão da Psicologia sobre o ensinar e o aprender e os professores possam se apropriar dessa tecnologia como mais uma ferramenta pedagógica.
É importante que o Psicólogo esteja atento a esses aspectos e pontue, sempre, que não será uma técnica ou uma ferramenta que fará a diferença na intervenção psicopedagógica, junto a alunos ou professores, mas, sim, a escuta, o olhar, únicos do Psicólogo, quer nos consultórios, quer nas escolas.
O Psicólogo na Escola: Ética
Além do olhar sobre as dificuldades de aprendizagem dos alunos, o Psicólogo Escolar tem também o compromisso ético com o desenvolvimento emocional, inteiro de cada criança.
Qual será a nossa postura quando a escola estiver querendo implantar um sistema de informática, com câmeras de filmar, que permitirá uma escola 24h no ar, numa total integração/controle virtual, tudo via internet?
Os pais poderão acompanhar (vigiar) os seus filhos através de imagens de circuito de tv; os boletins, notas de aula, tarefas de casa, fichas de acompanhamento estarão disponíveis no site da escola. Os fóruns de discussão entre pais/alunos/professores poderão acontecer virtualmente; haverá professores de todas as matérias, 24h/dia, disponíveis para tirar dúvidas de todas as disciplinas. Os atendimentos psicológicos também poderão acontecer via internet?
Precisamos estar atentos, pois no mundo pós-moderno o virtual parece estar ganhando espaço para o real, o verdadeiro. E, devemos nos lembrar, de que o ser humano é real. No mundo pós-moderno estamos lidando o tempo todo com os signos, com o simulacro. Simulação, informação são “tecnologizáveis”. O homem deve poder lidar com esses recursos, sem porém “fugir” para esse mundo de alienação. Cada vez mais a sociedade irá cobrar dos psi um posição frente a essas novas formas de interação (?) e precisamos estar abertos para a discussão.
24/08/2010
O Computador na Escola
15:32
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